quarta-feira, dezembro 13, 2006

Relatório da OCDE online

O Público faz na edição de hoje um resumo das recomendações do tão esperado relatório da OCDE sobre a educação terciária em Portugal. Para além disso, disponibiliza o texto integral do referido relatório em PDF.

Uma primeira nota, para referir que uma coisa que o relatório não recomenda é o aumento das propinas, com argumentos sensatos, diga-se.

Depois de uma leitura completa do texto integral, farei certamente alguns comentários.

segunda-feira, dezembro 11, 2006

O futuro que nos espera

Tenho por hábito ir lendo o que se publica no Guardian sobre Educação Superior (ES), já que a cobertura deste assunto costuma ser excelente.

Escrevi "ir lendo" porque tenho sempre um certo atraso. Este fim de semana tentava recuperar algumas destas leituras em atraso e deparei com um artigo interessante sobre o que perspectivas excessivamente economicistas estão a provocar na ES britânica. Estas leituras são particularmente úteis para nos irmos prevenindo, porque receio que o futuro nos possa reservar a breve prazo surpresas idênticas, se não soubermos agir atempada e vigorosamente.

Cito apenas um parágrafo:
The closure at Reading [of the Physics Department] says a lot about the state of higher education. A government department that is incapable of delivering on the prime minister's commitment to science, a funding body whose interest is in helping universities positively spin department closures, and governing bodies within our institutions who are often neither accountable to nor representative of staff or students.
O resto pode ser lido no site do Guardian. No final há ligações para uma série de artigos relacionados com esta problemática.

Quando se fala cada vez mais de modelos de governação das universidades (também em Portugal) é preciso pensar bem nas consequências que as alterações podem trazer. Há necessidade de mudanças, mas as instituições de ES são demasiado importantes para serem abandonadas a decisões cegas ou pouco avisadas.

Uma prova desta importância é um outro artigo, desta vez do New York Times de hoje (aqui as leituras tem um atraso menor...), que discute a importância duma ES de elevada qualidade na competitividade das nações, neste caso as asiáticas.

Achei precioso este excerto:
And second, is the Asian region any more than a series of nation-states obsessed with guarding their sovereignty — and do they have the ability to interact peacefully and constructively, much as the European Union is trying to do, to pool their individual strengths for the betterment of their region and the world beyond it? [ênfase meu]
Muito agradável de ler depois de ter lido as invectivas de Vasco Pulido Valente na última página do Público de hoje (domingo). Bem sei que eram dirigidas essencialmente contra o socialismo, mais do que contra a Europa, mas quem o ler pensará que nada de útil resulta da União Europeia.

E note-se que o excerto acima é escrito por um americano (Jeffrey E. Garten, former dean of the Yale School of Management and professor of international trade and finance).

Já o melhor livro que li sobre a União Europeia também foi escrito por um americano, Jeremy Rifkin ("The European Dream"). Leitura que recomendo vivamente.

Parece que são preciso olhares de fora para realçarem as virtudes que não conseguimos vislumbrar, apesar da proximidade.

sábado, dezembro 09, 2006

Fecho e fusões de universidades

Vem a propósito da muito divulgada (desde logo pelo jornal Público) notícia do Diário Económico intitulada "Uma universidade pública em Lisboa pode fechar". Pormenor curioso, a notícia referia apenas 4 universidades públicas (UL, UNL, UTL e ISCTE), mas há mais uma sediada em Lisboa: a Universidade Aberta, também pública.

Recordo que o ministro negou a possibilidade de fechar instituições no debate televisivo "Prós e Contras". Do mesmo modo, apressou-se a desmentir a referida notícia do Diário Económico, classificando a possibilidade nela aludida de "fantasia".

Ora, eu proponho uma provocação: porque não fundir TODAS as universidades públicas portuguesas numa ÚNICA universidade: a Universidade Portuguesa (UP). As tão faladas vantagens da escala seriam certamente ainda maiores.

E até há bons exemplos. A Universidade da Califórnia (UC) está dividida em pelo menos 10 campus (Berkeley, Davis, Irvine, Los Angeles, Merced, Riverside, San Diego, San Francisco, Santa Barbara, Santa Cruz). A respectiva página de Internet refere que:

The UC family includes more than 209,000 students, 124,000 faculty and staff, 45,000 retirees and more than 1.4 million living alumni.

Em 2003 havia apenas 14.117 ou 14.115 docentes e 9144 funcionários não docentes nas 15 universidades públicas portuguesas, segundo a DGES. O Eurydice reporta 14.858 no ano lectivo 2004/2005. O mesmo documento reporta 173.897 estudantes inscritos nas universidades públicas no mesmo ano lectivo. Portanto, a UP nem seria tão grande como a UC.

Um pormenor interessante é que destes dados podemos verificar que há 124.000 funcionários (docentes e não docentes) para 209.000 alunos na UC e apenas 23.261 (embora em 2003, mas o número não deve ser muito diferente em 2006) para 173.897 alunos na UP.

Os rácios são, respectivamente, 1,7 alunos/funcionário na UC e 7,5 alunos por funcionário na UP.

Afinal, somos aparentemente mais eficientes do que a Universidade da Califórnia!

Note-se que não subscrevo esta ideia a priori, embora talvez fizesse algum sentido em termos de introduzir alguma coordenação no sistema universitário público como um todo. Na UC as diversas unidades têm um elevado grau de autonomia e o sistema funciona mais como uma federação. Não seria despropositado de todo, mas receio que não se poupasse muito dinheiro a curto prazo, o que parece ser a preocupação essencial actualmente.

Melhor fundo de pensões em Portugal

Para variar uma questão diferente: qual é o melhor fundo de pensões português?

Julgo que ninguém acerta esta. A resposta, relativa a 2005, é o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS)!

A notícia, que só consegui localizar no Jornal de Negócios, revela os seguintes detalhes:

O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) foi eleito o melhor fundo de pensões português. O galardão foi atribuído pelo IPE - Investments & Pensions Europe, que desde 2001 premeia anualmente os melhores da indústria europeia de fundos de investimento. O fundo do Estado sucede assim ao BPI Pensões, vencedor da edição do ano passado.

Gerido pelo Instituto de Gestão de Fundos de Capitalização da Segurança Social (IGFCSS), o FEFSS é actualmente o maior fundo de pensões português, com cerca de 6,56 mil milhões de euros em activos sob gestão. Desde o início do ano, a sua carteira de investimentos já cresceu 5,81% face aos 6,2 mil milhões de euros registados no final de 2005. Também em retorno, o fundo do Estado bate algumas das previsões para o mercado português.


Em 2006, regista uma rendibilidade nominal de 5,2%, enquanto as estimativas da Mercer Investment Consulting para os fundos de pensões nacionais apontam para uma rendibilidade média de 4,8%. Já a Watson Wyatt prevê, para o mesmo período, uma rendibilidade média de 7,4%. No ano passado, o FEFSS obteve uma rentabilidade nominal de 6,76% e real de 4,44%.

Como sou muito desconfiado, fui verificar e confirmei o prémio conferido pelo IPE - Investments & Pensions Europe.

Infelizmente, não é possível comprar participações adicionais neste fundo com tão boa performance, que nem cobra comissões de subscrição e de resgate e que tem um custo de gestão também muito baixo, quando comparado com os seus congéneres privados. Lá se vão as virtudes da gestão privada!

Um debate infectado de desinformação é o da Segurança Social e, em particular, das pensões geridas pelo estado. Aliás, o facto da restante imprensa, mesmo a da especialidade, apenas referir as previsões de rentabilidade média, sem mencionar o prémio é indicadora do desconforto que este gerou.

Voltarei a este assunto.

Paradoxos

Os meus posts anteriores geraram alguns comentários interessantes e esclarecedores de algumas dúvidas que tinha.

Desde já agradeço os incentivos.

Quanto a ter o "Prós e Contras" sido ou não esclarecedor, eu acho que foi para quem esteja minimamente informado sobre as questões da Educação Superior. No entanto, esforcei-me por ouvir o máximo de opiniões de pessoas que viram o debate e não têm este tipo de conhecimento (a maioria dos espectadores, provavelmente) e foi com base nesse feedback que escrevi.

Pessoalmente, achei esclarecedor sobre o estado actual do sistema de ensino universitário, mas sobre o seu futuro fiquei menos esclarecido, nomeadamente sobre o que a tutela pretende objectivamente fazer.

Continuando as reflexões sobre questões específicas, parece-me preocupante a ausência do CIPES (Centro de Investigação de Políticas do Ensino Superior) deste debate público sobre o futuro da Educação Superior. Aliás, não consta que o próprio MCTES ouça o CIPES. O que é paradoxal porque é o único centro de investigação do país sobre este assunto, com muito e bom trabalho publicado e reconhecido internacionalmente. Ainda por cima, financiado em parte pelo próprio estado português!

A missão do CIPES, tal como é enunciada na sua página de Internet, é esclarecedora:

O CIPES é um Centro de Investigação criado em 1998 pela Fundação das Universidades Portuguesas do Conselho de Reitores (CRUP). O Centro é financiado pelos Ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, pelos Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas e por Universidades membro.
As linhas de orientação são traçadas pelo Conselho Científico – de que fazem parte, além dos membros da Direcção, os responsáveis pelos projectos de investigação. O Presidente é designado pelo CRUP e os dois Vice-Presidentes são nomeados pelo CRUP, sob proposta do Presidente.
O CIPES colabora em diversos programas de pós-graduação das Universidades membro, onde se inclui programas de Mestrado e de Doutoramento.
As definições estatutárias do Centro permitem-lhe cooperar com governos, instituições educacionais e institutos congéneres, nacionais e estrangeiros. O CIPES é membro fundador da Associação Europeia HEDDA – Higher Education Development Association, de que fazem parte outros Centros Europeus, tais como: o CHEPS (Holanda), o CSET (Reino Unido), o IREDU (França), NIFU (Noruega), PFI (Noruega) e o Coordinating Structure of Finnish Higher Education Research (Finlândia).
O CIPES possui um perfil e uma orientação interdisciplinares, provindo os seus investigadores das mais variadas áreas do conhecimento e do desempenho das mais diversas funções no domínio do Ensino Superior. Esta opção tem permitido um evidente enriquecimento das abordagens e dos trabalhos de investigação levados a cabo.
O CIPES, desde a sua fundação tendo vindo a organizar Seminários Científicos Internacionais de alto nível em áreas chave das políticas de ensino superior.

Havendo uma instituição deste tipo, não deveria ser ouvida sobre estes assuntos? Nem no "Prós e Contras", apesar de alguém (não me recordo quem, terá sido o Prof. Adriano Moreira?) ter referido o nome do Prof. Alberto Amaral, director do CIPES.

Outra situação paradoxal é a ênfase que a retórica governamental coloca na qualidade e na garantia da qualidade (Quality Assurance) na Educação Superior, mas que não se traduz num empenho idêntico em acompanhar o que se faz internacionalmente neste âmbito.

Concretizo: decorreu há alguns dias, em Novembro, o 2006 European Quality Assurance Forum: "Embedding Quality Culture in Higher Education". O título sugere a relevância do evento. Quem esteve presente representando o governo português? Aparentemente ninguém!

De Portugal estiveram presentes apenas representantes: dos estudantes (um), do CIPES (um), da Universidade de Aveiro (dois), do Porto (um) e de Lisboa (dois). Só.

Deve ser significativo, não?

Coordenação da Educação Superior em Portugal

Um dos aspectos focados no "Prós e Contras" sobre o futuro do ensino superior (ver apontamento anterior) foi a questão da necessidade de as universidades se coordenarem na organização da sua oferta educativa.

Esta necessidade foi mencionada pelo ministro Mariano Gago. No entanto, esta coordenação não resulta fácil porque há fortes desincentivos. Por um lado, as universidades públicas concorrem efectivamente entre si e, por outro lado, o financiamento proveniente do Orçamento de Estado é atribuído maioritariamente em função do número de alunos. Neste contexto, nenhuma instituição se atreve a sujeitar-se voluntariamente a restrições da sua oferta educativa. No entanto, parece ser isto que o ministro sugere que façam, sendo que o CRUP parece andar a estudar o assunto.

O CRUP tem, neste assunto, um papel complexo, porque necessita de conseguir consensos para que se concretize alguma acção. Veja-se o que se tem passado com a "sugestão" de uniformizar e reduzir as nomenclaturas de cursos de licenciatura (1º ciclo), aliás um dos pontos em que o ministro brilhou, ao referir que pediu uma reorganização da oferta educativa e saiu-lhe uma reorganização dos nomes dos cursos! Ainda assim, estas normas do CRUP não têm sido seguidas pelas universidades, apesar de terem sido (supostamente) acordadas entre todas elas.

Devo salientar que, como em outros aspectos, o ministro da tutela pretende isentar-se de tomar decisões nesta matéria. Em Espanha existe no Ministério da Educação e Cultura um Consejo de Coordinación Universitaria, que permite exactamente estabelecer alguma coordenação do sector pela tutela governamental.

Em Portugal, temos um problema gravísismo no sector da Educação (a todos os níveis) que consiste em se pretender que as instituições assumam cada vez mais responsabilidades sobre os seus destinos, mas sem que a tutela ceda controle no processo, com a agravante de actualmente pretenderem ainda poupar dinheiro. Por isso, o MCTES quer que as universidades se entendam para reorganizar a oferta educativa global, mas recusa-se a fornecer os meios e a impor objectivos claros. O ME pretende escolas cada vez mais autónomas, mas não quer perder o controle dos currículos, da admissão dos professores, etc. e com menos despesa...

Nada disto faz sentido. Os ministérios (ME e MCTES) devem ter uma função essencialmente reguladora dos sistemas educativos, criando regras claras e estáveis para as instituições, públicas e privadas, exercerem as respectivas actividades. Deve ainda assegurar que as regras são cumpridas e avaliar, certificar e divulgar os desempenhos obtidos, numa lógica de responsabilização efectiva de todos os intervenientes no processo.

Decisões políticas claras, precisam-se!

sexta-feira, dezembro 08, 2006

Prós e Contras sobre o futuro do ensino superior

Finalmente tempo para escrever algumas reflexões acerca do "Prós e Contras" sobre (supostamente) "O futuro do ensino superior", de 27 de Novembro de 2006.

A demora contribuiu, no entanto, para ir assentando ideias.

A primeira nota vai para o pouco debate público acerca do programa. Tirando o que li nalguns blogues (JV Costa, Polikê?, Que Universidade?), pouca análise vi.

Para além disso, tenho a sensação que, para o público em geral, o debate não foi minimamente esclarecedor e contribuiu para estabelecer ou reforçar ideias como: que a maioria dos reitores das universidades são realmente incompetentes ou, pelo menos, incapazes de se fazer compreender; que as universidades são instituições imobilistas e despesistas; que o ministro tem de cortar nos respectivos orçamentos para forçar mudanças necessárias (não se sabe bem quais); que falta de legislação fundamental; que as universidades privadas fazem o mesmo que as públicas com muito menos dinheiro; que os politécnicos não existem!

O nível geral do debate foi morno, destacando-se apenas pela positiva o desempenho do reitor da Universidade de Lisboa, António Nóvoa (o único a quem a generalidade das pessoas reconheceram competência; não foi por acaso que foi o escolhido para estar no palco) e do Prof. Adriano Moreira. Ainda assim receio que a intervenção deste último possa não ter sido compreendida, porque me parece que foi marcante para os espectadores essencialmente pela autoridade que emana e respeito que impõe. Até a apresentadora, Fátima Ferreira, se absteve de gerir esta intervenção, o que não é comum.

Uma última nota para o péssimo desempenho (não sei a que título) do sidekick do ministro! O que estava ali a fazer o Prof. Luís Moniz Pereira? Foi apresentado como professor da UNL, não se percebendo a razão da escolha. Não foi certamente como representante sindical...

Nas próximas entradas irei analisar aspectos específicos sobre o futuro do ensino superior relacionados, mais ou menos directamente, com este debate.

Dar espaço às universidades privadas

O Diario Económico continua a ser uma fonte interessante, apesar de limitada, sobre o que se passa no Ensino Superior, através da sua secção "Universidades", que é publicada às terças feiras.

Na última terça feira, dia 5 de Dezembro, um pequeno comentário assinado por David Dinis no Diário Económico, intitulado "Universidades à procura da razão", que apontava precisamente para a secção "Universidades", continha o seguinte:
A racionalidade económica tem destas coisas: é clara como água, incontornável como uma grande montanha. E face a isto as universidades pouco podem dizer. O que o ministro quer dizer, no fundo, é que nada pode ficar como aqui, se o ensino superior quiser mesmo mudar em Portugal. De nada servirão as queixas (justas) dos reitores, quanto à falta de verbas para o seu funcionamento, se os próprios não perceberem que vão ter que mudar. As universidades precisam de ganhar escala, mas também sustentabilidade - dando espaço às privadas para que façam precisamente o mesmo. Será este o desafio de Gago: ganhar o apoio do sector para uma reforma tão inevitável como fundamental. O resto, virá por acréscimo.
O que me chamou a atenção foi a frase que destaco a vermelho. Afinal, o objectivo é este: dar espaço às universidades privadas?! Mas elas precisam que lhes seja dado espaço? De que espaço estamos a falar? Então porque não mudam elas, conquistando o seu próprio espaço?

Faz-me recordar uma expressão da infância: gato escondido com o rabo de fora...